Querido Mauro Vinicius,
Não vou
endereçar essa carta diretamente a ti, na esperança que os ventos dos rumores
se encarreguem de deixá-la na sua porta. Já faz alguns meses desde o nosso
rompimento, mas ainda há alguns fantasmas de nosso relacionamento que se
corrompem comigo. Falo da opinião alheia: aquela que nos perseguiu em todas as
fases do nosso amor.
Não sei se
você se recorda de um início onde evitávamos o afago das mãos em qualquer
ambiente. Quando os dedos finalmente se permitiam aproximação, chegava a ser
eletrizante. Costumávamos escolher lugares distantes para nossos encontros –
assim nos sentíamos um pouco mais livres e ainda tínhamos o adicional de
explorar a cidade. Ainda assim, o receio do olhar do outro se mantinha
constante: esmagava nosso afeto, cobria de penumbra nossa troca de olhares,
implodia nossos beijos espontâneos.
Lembro-me de uma
fase em que realmente nos sentíamos livres. Em que eu sorria o seu sorriso e
dividíamos miojo sentados na grama de um festival musical de público grande. Em
que você não se importava de disfarçar o seu olhar apaixonado ao me fotografar.
Em que era uma verdadeira leveza poder sentir o contorno do seu rosto enquanto
a gente se enamorava.
Porém, apesar
disso tudo, o outro ainda ali se encontrava. Estava na nossa alegria ao recitarmos
as músicas românticas dos shows, que era cortada por comentários inoportunos ao
fundo. Estava no fitar demorado de desprezo enquanto a gente simplesmente
caminhava. E por fim, o golpe fatal de nossa relação: ele estava enraizado
profundamente em meu coração. Ele estava sempre lá, aguardando quaisquer
indícios de confusão ou baixa de autoestima para florescer. Estava lá
aguardando pacientemente o ambiente torna-se nutritivo para a sua seleção. E
obviamente as conturbações vieram.
Ficamos
doentes: não vejo culpa em nenhum de nós por isso. Foi algo acima de nosso
controle e precisávamos entender e aceitar. Mas, para além disso, aquela raiz
instaurada só fazia crescer e crescer. Se você fechar os olhos, consegue
imaginar seus ramos crescendo e se engalfinhando entre meus sentimentos e
sensações, de forma a deixá-los presos. Aprisionados. Reprimidos. Tudo se
tornara tão turvo que aquelas sensações antes eletrizantes foram substituídas
por algo doloroso: como se a intenção de existir e resistir as sufocasse entre
os ramos já tão apertados, até seu sangramento. É esse líquido que corre em mim
feito veneno me entorpecendo todos os dias.
Sei que nosso
afastamento foi muito necessário para que melhoremos, mas escrevo essa carta
porque entreouvi por aí que você acredita que já não te gosto mais. Escutei as
pessoas destilarem opiniões sobre como eu me sinto... Ah, Mauro Vinicius. Você
não imagina o quanto isso me dói. É a energia cinética necessária para
catalizar a ação desse veneno que só me corrói dia após dia. Você sabe mais do que ninguém que nunca foi
minha escolha parar de gostar de você, e que essa nunca foi a razão pela qual
não conversamos mais. Ainda te amo demais, mas essas raízes conseguem me afogar
de topor a ponto de serem mais dolorosas do que nosso amor poderia aguentar. Eu
espero que você esteja bem e seguindo cada vez mais nesse propósito de
melhorar. Só desejo que você não permita que digam por aí que não sofro com todo
esse desenrolar...
Ainda
é seu esse coração,
Rodolfo.